quinta-feira, 4 de abril de 2013

O cachecol e a autosabotagem

  
Floco, posando pra foto com cara de "me deixe dormir!"


Eu terminei meu primeiro cachecol. É esse aí de cima, enrolado no meu cachorro que, quase às duas da manhã, teve de trabalhar como modelo. E o que há de importante nisso? É que minha vida acaba de mudar pra melhor: encerrei o ciclo da autosabotagem. 

Como? Você não consegue enxergar relação entre o cachecol e a autosabotagem? Bobinho, eu explico. 

Desde sempre eu tive dificuldade de fazer coisas pra mim. Meu foco sempre foi o outro. Realizar tarefas sempre esteve ligado a fazer algo por qualquer outra pessoa, seja em relacionamentos, trabalhos, família, amigos. Eu tenho uma facilidade incrível de resolver os problemas e desafios que estão fora de mim. Se você me disser que está com dificuldade em qualquer área prática da sua vida (e me pedir ajuda), eu vou fazer o diabo pra resolver sua situação. Eu bolo planos, falo com Deus e o mundo e... resolvo. Pode não ser hoje, mas resolvo. E não descanso até terminar.

Mas... pra fazer tudo isso, eu tiro totalmente o foco de mim.

E alguns fatos recentes me fizeram enxergar a gravidade disso na minha vida. Uma delas é ter encontrado uma família que precisava de ajuda, sem casa, sem chão, sem perspectiva na cidade. Eu não pensei duas vezes e criei estratégias pra ajudar, e, graças ao apoio de muita gente, deu tudo certo. Eles conseguiram casa, dinheiro pro aluguel, móveis, comida, tudo o que era necessário pra recomeçar a vida. Isso levou só uma semana e meia, o que me espantou bastante. Eu fiquei totalmente imersa nessa questão até conseguir resolvê-la (e foi lindo).

Na semana seguinte, fui pra cidade da minha família pra ajudar minha irmã com seus preparativos finais antes do nascimento da primeira sobrinha (viva a Manuela!!). E lá fiquei, bem feliz, resolvendo coisas aqui e ali (e foi lindo, também). 

Pois bem. Voltei pra minha cidade na sexta-feira de noite, porque no domingo tinha um concurso público pra fazer. Durante o sábado todo fiz coisas aleatórias: de aula de inglês à visita a uma feira de empreendedorismo. Às onze horas da noite de sábado me lembrei de um detalhe: eu devia ter imprimido o comprovante de inscrição para aprensentar na prova, que era às oito da manhã do dia seguinte. Céus. Onde, agora? E mais: precisava de xerox da identidade e uma foto 3x4 (que eu devia ter em casa, mas não sabia onde). 

Quer dizer: criatura, você lembra de fazer TUDO o que se propõe por qualquer pessoa, durante semanas. Menos por... você mesma? E diante de um problema que era só meu eu simplesmente travei. Não sabia absolutamente o que fazer. Não conseguia bolar um plano, só me culpar por tamanha besteira. 

O que me intrigou é que eu tinha essas informações na cabeça, havia lido o edital e sabia o que precisava imprimir e apresentar. Mas isso não me apareceu na memória a tempo de eu poder realizar. (Na psicanálise isso é chamado de ato falho e, em geral, revela algo que eu não estou querendo admitir ou enxergar.) 

Era meia noite e eu só sabia me lamentar por tudo, depois de tentar pequenas coisas que não deram certo. Pra minha alegria (e pra mostrar que, sim, é possível superar os meus problemas), meu namorado apontou algumas saídas e, num ato heróico, salvou a minha participação no concurso. Eu já havia decretado o fim: não dá, não dá, pronto, não faço essa merda. E provavelmente não faria se ele não tivesse me acalmado e mostrado uma luz no fim do túnel e tivesse tomado a frente da situação. Deu certo: fui lá e fiz a prova. Claro que não fui super bem, afinal, mal tinha estudado. E por que, mesmo? Ah, porque eu tinha dedicado todas as minhas horas das últimas semanas a fazer outras coisas que não cuidar de mim mesma.

Esse foi o episódio 1. O segundo aconteceu essa semana.

Entrevista de emprego. Graças a uma amiga, consegui uma entrevista de emprego num lugar muito, muito bacana. Pra evitar problemas como o anterior, me preparei pra entrevista. Pesquisei sobre a empresa, li, reli, anotei. Calculei quanto tempo precisaria pra chegar até lá, de ônibus, acordei na hora certa, me arrumei e... saí atrasada. Quando cheguei no ponto de ônibus, dois deles acabavam de seguir rumo a outos pontos onde as pessoas chegam no horário certo porque não se autossabotam. Faltavam vinte minutos pra entrevista e eu ali, esperando. Ah, sem dinheiro pra táxi, dinheiro que gastei com coisas aleatórias e provavelmente bem menos importantes do que isso. 

Dez minutos pra entrevista. O ônibus chega, mas, claro, vou me atrasar. Entrei no lugar com quinze minutos de atraso e, claro, me culpando e esperando qualquer tipo de punição, algo como "então, Gislaine, você costuma fazer pouco caso de seus compromissos, hein?". 

Respirei e esperei a moça que iria me entrevistar. O ambiente era ótimo, a oportunidade ótima, as moças da entrevista, super receptivas. E o que eu faço? Falo mal de mim mesma. Nas perguntas sobre minhas características, desando a falar sobre como minha curva de aprendizagem é rápida e como preciso me manter motivada pra continuar a realizar tarefas.

POR QUÊ, CRIATURA?

Ainda não sabia, direito. E falei, falei, e, vendo a cara das moças torcendo pra que eu parasse de falar mal de mim, tentei ir pra outro lado, mas no fim a minha sensação foi de que eu estava dizendo: ei, sou ótima, mas não mereço esse trabalho.

E vim pra casa me perguntando: que que há, garota? Não era, claro, a primeira vez que eu fazia isso. Em situações onde preciso me auto afirmar, escorrego na casca de banana das histórias em quadrinhos e me torno uma piada triste. 

Então comecei a pensar sobre todas as vezes em que me boicotei, seja saindo de um emprego por acreditar que não daria conta (descobririam que nem sou tanta coisa assim?) ou nas situações em que dei o melhor de mim pra realizar coisas por outras pessoas. E fui perguntar pro Google. Vamos lá: autoboicote, auto-estima, perda de foco: por quê eu faço isso, internet?? Caí num universo de páginas que descreviam com detalhes o tipo de comportamento que adotei praticamente a vida toda: não realizar nada por mim por medo de não conseguir o resultado esperado. Parar no meio do caminho pra poupar esforço, com a desculpa de que, se tivesse ido até o fim, teria sido um sucesso. Problema grave de auto estima, provavelmente baseado em crenças limitantes que vêm da família e da infância, distorção de imagem própria, entre outras coisas que fizeram todo o sentido. 

Tá, tá, eu sei que a internet não resolve os problemas psicológicos do mundo, mas eu tive o insight de que precisava. Jamais tinha me dedicado à mim mesma com o mesmo afinco que tenho por outras pessoas ou situações alheias. Quando ajo, em geral é pra atender, responder, ajudar, entregar, etc.. Daí que quando chego num ponto ou projeto que tem a ver com o meu crescimento, sem co-participações, eu travo e perco a vontade. É como se eu só existisse pelo outro, como se a minha imagem no espelho não tivesse forma, a não ser pelo reflexo da minha relação com o outro. E, por esse motivo, eu mal conheço minhas próprias vontades e intenções.

E... BAM! Não poderia ser o som de um sino, claro, uma percepção tão forte assim. Foi mais uma pancada, uma tora de madeira caindo no meio do meu apartamento de 50 metros.  

Depois disso, comecei a pesquisar métodos, técnicas e dicas pra focar nas minhas necessidades, intenções, planos. Achei um bilhão de conselhos muito valiosos que até divido com quem tiver interesse no assunto. 

E, boas novas! Desde então, consegui, finalmente, me dedicar a estudar (pra um novo concurso), tenho me concentrado, não tenho problemas em sair da cama pra fazer isso. Tenho conseguido organizar minha casa (uau!) sem ficar enrolando até não poder mais. E quando leio textos que apontam as dificuldades de se fazer isso ou aquilo que eu quero fazer (por exemplo, quais as dificuldades de se estudar em casa), enxergo como algo normal, ou mesmo um desafio, e não mais como uma predestinação ao meu fracasso, como antes.

E aí, depois disso tudo, hoje de noite sentei para descansar. Liguei a tv e peguei o cachecol que, há um ano, começo e paro. Sim, um ano!! Enquanto assistia, fui fazendo e fazendo e não quis mais parar, até chegar ao fim. E foi uma das melhores sensações que já tive: concluir algo por mim, porque eu queria, porque eu tinha o objetivo de chegar até o final. E cheguei. 

Por isso o cachecol é o símbolo do fim da minha autosabotagem. E por isso eu não duvido mais de mim mesma. Ao contrário, tenho acreditado muito que todas as ações que eu quiser (realmente quiser) vou conseguir realizar até o fim. 

E essa é a minha história.

Meu nome é Gislaine, obrigada por me ouvirem. 

=))

P.S.: Não faço ideia se os termos autosabotagem, auto-estima e auto boicote estão escritos corretamente. Mas isso, nesse momento, não muda minha vida.