Cena de "O diário de Bridget Jones" |
Acabo escrevendo sempre em terceira pessoa. Sou um pouco voyeur. Ok, sou bastante. Tenho dificuldade em tornar real, na minha cabeça, o que é escrito em primeira pessoa se sei que não é verdade. Que não aconteceu. Consigo tornar factível só o que é real. Mania de jornalista? Escritora de merda, eu diria.
Começa e vou até três, quatro parágrafos. Tudo soa ridículo e forçado. A tendência a ser autobiográfica me perseguindo. E o que não é sobre a gente mesmo, afinal?
Conheço pouco da vida, diz a voz da crítica interna. E o amor, o que é o amor, se colocado em páginas? E o que precisa ser colocado em frases e palavras e virar textos e livros e filmes?
Gosto das pessoas reais, das histórias reais. Mas tenho problemas com conflitos. Tô lá, vendo um filme. Quando chega a hora do conflito, do desastre, das mortes, dos alienígenas invadindo a Terra e eu quero parar. Encaro um filme como se fosse a verdade. Que pra mim a história é sempre real, senão não tem sentido. E eu sinto a dor dos personagens e não quero sentir. Sinto a angústia, o desespero. Me dói, quero sair e ver flores e bichos que falam em desenho animado.
A fuga de conflitos e a dificuldade de contar uma história em primeira pessoa. Os dilemas que enfrento (de que fujo, vamos falar sério) na hora de escrever são os mesmos que me afligem na vida cotidiana. Óbvio, óbvio.
Tá lá a moça evitando conflito e dizendo o que todos querem ouvir. Apaziguando, botando panos quentes, equilibrando lados da balança, criando climas agradáveis a todo momento. Tá lá a menina buscando o lado positivo da vida, ainda que fale mais do lado negativo. Tá lá a mulher que passa por cima dos problemas com o rolo compressor e não absorve, não assimila, não resolve. Vai passando, jogando flores e tentando ver as belas cores da manhã que aparecem em meio a um campo seco, árido.
Tá lá a moça que quer fazer mil coisas e se perde em interrupções. Da mente, do Facebook, do próximo trabalho, da televisão, da distração que é viver o tempo todo dez minutos à frente ou oito meses para trás.
Tá lá ela. Sentada, de moletom preto e meias brancas, corcunda e com marcas de postura errada na barriga, se descrevendo ridiculamente em terceira pessoa. Foi ali fazer chocolate quente e disse que já voltava. Mas se distraiu com a novela.
O legal de escrever em terceira pessoa, neste caso, é que você se dá a chance de observar o que acontece com você mesma. É como se você dissesse "peraí, vou sair de mim para me olhar um pouco". E sabe o que é ainda mais legal? É que eu leio o trecho disperso e acho que a moça pode ser você, mas também pode ser eu. Aliás, minha caneca e minha lista de coisas não feitas confirmam isso :)
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