A solidão de
Mariana gosta quando ela fica em casa sem barulho, só ouvindo a rua que lá fora
respira e guia as pessoas para seus compromissos. A solidão de Mariana gosta de
ficar em paz sem ninguém por perto. Ausente de si e dos desejos.
Mas tinha lá suas vontadezinhas,
pequenas ambições. As grandes, não, essas quase nunca. E para tudo o que
desejava ela gostava de definir um número, como produtos em um catálogo, pratos
em um menu. O três era o número das coisas impossíveis. Querer ganhar na Mega
Sena era um três. Esperar o ônibus chegar era um cinco: o tipo de coisa que vai
acontecer, basta saber esperar. O oito precisava de um pouco mais de paciência:
poupar 30 reais por mês para comprar um massageador de pés. O doze era pra
ocasiões especiais, aquelas que a gente não esquece e quer guardar em um
porta-jóias. O porta-jóias, aliás, era um sete, coisas antigas que ficam pra
trás aos poucos e de repente a gente não lembra mais que existiram um dia, como
o trema, a letra cursiva e o óleo de soja em lata de alumínio.
Trabalhar numa loja de turismo
num shopping center era um oito: paciência pra atingir algo que ela ainda não
sabia o que era, mas que com certeza iria lhe aparecer na mente como um pedido
de hambúrguer que fica pronto e a senha fica no display em vermelho. Ou a
atendente grita: vinte e sete. E lá estará o sonho que sempre precisou ter no
coração, prontinho pra ela dizer: sempre quis isso. Enquanto isso, guardava
dinheiro para algo que desejaria fazer um dia. Quem sabe uma viagem pro
exterior, um anel de diamantes ou só o resto da vida usando uma roupa nova por
dia. Coisas simples.
É, é verdade que faltava a ela
essa vontade louca de alcançar algo, de ter um objeto, de querer alcançar uma
coisa com tanto desejo que doeria. E com essa falta ela tomava sopa diet todas
as noites. Só queria paz nos pensamentos e um cachecol diferente por inverno e
pra isso não eram necessários tantos projetos assim.
Gisi que texto lindo! Não passível de nota eis que não limitado por qualquer escala numérica!
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